O Supremo Tribunal Federal (STF) validou nesta quinta-feira (26) a possibilidade de bancos tomarem, sem decisão judicial, imóveis financiados com parcelas atrasadas, em uma decisão que promete impactar o mercado imobiliário brasileiro. A medida, que foi aprovada por oito votos a dois, segue o entendimento do ministro relator, Luiz Fux, e permite que o processo seja realizado em um curto prazo de 30 dias, sem dar margem à contestação por parte do devedor.


A decisão se refere especificamente aos imóveis financiados pelo Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), que é destinado a pessoas que já possuem imóveis ou desejam adquirir propriedades avaliadas em mais de R$ 1,5 milhão. Imóveis com valores inferiores ainda podem ser financiados pelo SFI, que oferece mais flexibilidade do que o Sistema Financeiro de Habitação (SFH), a modalidade subsidiada.


O caso em questão, que levou a essa decisão, envolvia um imóvel avaliado em pouco mais de R$ 60 mil, cuja ação foi iniciada em 2007. Advogados especializados no mercado imobiliário ressaltam que a recuperação do imóvel por meio do cartório já era prática comum no setor, e a decisão do STF, portanto, serve para confirmar a constitucionalidade desse instrumento.


Segundo o ministro Luiz Fux, a alienação fiduciária, baseada em uma lei de 1997, já era utilizada em mais de 94% dos contratos em 2017. Com a decisão do STF, os bancos ganham mais agilidade para retomar imóveis em caso de inadimplência.


**Prazo para Recuperação do Imóvel**


Os bancos podem acionar o cartório para executar o contrato após três parcelas em atraso, embora a maioria dos contratos determine um prazo de oito a nove meses para solicitar a recuperação do imóvel no cartório. Uma vez iniciado o processo, o cartório notifica o devedor, que tem 15 dias para quitar as pendências, incluindo juros, multas e encargos. Após mais 15 dias, o banco pode leiloar a propriedade.


Para evitar o leilão, o devedor pode procurar a Justiça para contestar a alienação fiduciária com um pedido de cautelar, mas isso depende de uma decisão favorável do tribunal.


**Opiniões Divididas**


No STF, os ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia foram contrários à decisão, argumentando que ela concede poderes excepcionais a uma das partes do contrato, prejudicando o direito fundamental à moradia. A Defensoria Pública da União também defendeu que o instrumento desrespeita o devido processo legal, o direito ao contraditório e a ampla defesa, alegando sua inconstitucionalidade.


Os ministros que votaram a favor da decisão argumentam que o devedor ainda tem a possibilidade de buscar a Justiça para suspender a alienação fiduciária, preservando, assim, o direito ao devido processo legal. Contudo, a Defensoria Pública destaca que o acesso à Justiça é limitado, com apenas cerca de 58% das pessoas tendo acesso nos níveis estadual e federal, deixando 42% sem garantias constitucionais.


Nos casos em que o devedor reside no imóvel, também há preocupações quanto ao respeito ao direito social à moradia.


O Procon-SP e a Associação Brasileira de Mutuários da Habitação (ABMH) ainda não se pronunciaram sobre a decisão.


**O que é Alienção Fiduciária?**


A alienação fiduciária, estabelecida por lei em 1997, é uma forma de garantia usada no Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), onde o próprio imóvel serve como caução. O bem imóvel permanece em nome da instituição financeira até que a dívida seja quitada. O comprador tem o direito de uso do imóvel durante o financiamento, mas a propriedade só é consolidada em seu nome após a quitação da dívida por meio de um registro em cartório.


Essa modalidade substituiu a hipoteca, criada em 1966, que exigia que o imóvel ficasse no nome do financiador e que o banco recorresse à Justiça para reavê-lo. A alienação fiduciária também evita que o mesmo imóvel seja usado como garantia em diferentes instituições financeiras, o que desestimula refinanciamentos que podem resultar em novas dívidas.